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Auditorias públicas influenciam reeleições no Brasil?

20 ago 2021

Pesquisador responsável: Angelo Cruz do Nascimento Varella

Título do artigo: EXPOSING CORRUPT POLITICIANS: THE EFFECTS OF BRAZIL’S PUBLICLY RELEASED AUDITS ON ELECTORAL OUTCOMES

Autor do artigo: Claudio Ferraz e Frederico Finan

Localização da intervenção: Brasil

Tamanho da amostra: 373 municípios brasileiros

Grande tema: Política Econômica e Governança

Tipo de Intervenção: Reeleição de prefeitos em
municípios auditados

Variável de interesse principal: Informações de auditorias públicas aleatórias em municípios com prefeitos concorrendo à reeleição

Método de avaliação: Avaliação Experimental (RCT)

Contexto da Avaliação

Informação e transparência são necessárias para o devido funcionamento de uma democracia. Para tanto, os cidadãos devem ser informados sobre seus líderes de modo a responsabilizá-los por seus atos e definir quem deve ser escolhido em processos eleitorais. Entretanto, em sistemas nos quais os cidadãos não recebem informações suficientes sobre os políticos em exercício, não é possível monitorar ou penalizar atos impróprios.

Neste sentido, esforços para aumentar a transparência e a disponibilidade de informações úteis à sociedade, como auditorias públicas, configuram elementos fundamentais para a identificação de políticos corruptos por parte dos eleitores. Consequentemente, torna-se possível punir a corrupção, de modo a forçar tais políticos a atuar em prol do interesse público, ou até mesmo fortalecer a candidatura de indivíduos idôneos.

Com o intuito de fortalecer a transparência e disponibilizar informações relevantes sobre a utilização de verbas federais nos municípios brasileiros, o Governo Federal deu início, em 2003, a uma das principais iniciativas para o combate à corrupção política no Brasil, por meio da Controladoria Geral da União (CGU). Tal programa foi utilizado pelos pesquisadores para avaliar o impacto que a divulgação de tais informações possuiu nas eleições municipais brasileiras do ano de 2004.

Detalhes da Intervenção

O Programa de Fiscalização por Sorteios Públicos da CGU consiste em um sistema de loterias que escolhe aleatoriamente municípios brasileiros para terem suas contas auditadas. Podem ser sorteados municípios com menos de 450 mil habitantes, o que engloba cerca de 73% da população do país, excluindo capitais e grandes centros urbanos. O intuito do programa é garantir a utilização apropriada dos recursos federais repassados aos municípios brasileiros, assegurando a participação da sociedade no monitoramento dos gastos públicos.

Uma vez escolhido pelo sorteio, a CGU recolhia todas as informações disponíveis sobre os fundos federais recebidos pelo município, entre 2001 a 2003. Posteriormente, um grupo de 10 a 15 auditores eram enviados ao local para examinar as contas e documentos oficiais, inspecionando se havia algo de indevido ou inadequado na execução orçamentária do município, assim como a qualidade dos bens e serviços públicos ofertados. Cabe ressaltar que os auditores passaram por um severo sistema de verificação e eram bem treinados, remunerados e supervisionados.

Após aproximadamente 10 dias de inspeção, os auditores produziam um relatório formal que era enviado à central da CGU, em Brasília. Posteriormente, os relatórios eram encaminhados ao Tribunal de Contas da União (TCU), a procuradores públicos e ao respectivo poder legislativo municipal. Os relatórios também eram resumidos para publicação na página online da CGU e posteriormente remetidos aos grandes canais de mídia.

Detalhes da Metodologia

Até julho de 2005, o programa havia realizado 676 auditorias, em 669 municípios distintos. Para definir qual o impacto da divulgação dos resultados das auditorias públicas nas eleições, foi necessário selecionar apenas os municípios nos quais os prefeitos estavam aptos à reeleição, totalizando 373 municípios, que configuram a base de dados utilizada na pesquisa.

A partir da formação dessa base de dados, os pesquisadores dividiram os municípios contemplados em dois grupos, de acordo com a data de realização das auditorias públicas:

  • Antes das eleições municipais de 2004 – 205 municípios;
  • Depois das eleições municipais de 2004 (grupo de controle) – 168 municípios.

O intuito dessa divisão é averiguar se a ocorrência de uma auditoria pública tem o potencial de influenciar na decisão dos eleitores. Como a base de dados foi formada aleatoriamente pelas loterias, é possível utilizá-la para mensurar se as auditorias municipais tiveram impacto na reeleição dos prefeitos e nas margens de votos.

No que se refere aos atos de corrupção política, os autores diferenciam os níveis de corrupção de acordo com a recorrência da identificação de práticas ou atos corruptos. Ou seja, quantas vezes os relatórios identificaram atos de procedimentos fraudulentos, desvios de verbas públicas ou superfaturamentos durante o mandato do prefeito apto à reeleição.

Para complementar a análise, também foram utilizadas informações sobre os processos eleitorais dos municípios, nos anos de 2000 e 2004, assim como dados sobre os prefeitos, provenientes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Informações adicionais sobre os municípios foram extraídas do Censo demográfico de 2000 e da pesquisa “Perfil dos Municípios Brasileiros: Gestão Pública”, ambos realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Uma das variáveis complementares de maior importância para a análise trata-se da presença de mídias locais, representadas majoritariamente pelas rádios AM. Os autores destacam que apesar dos jornais e mídias televisivas fazerem a cobertura dos resultados das auditorias públicas, a absorção dessas mídias não se compara à presença das rádios regionais, que possuem uma importância significativa na disseminação de informações políticas nos municípios brasileiros, uma vez que cerca de 79% das residências dessas localidades possuem um aparelho de rádio.

Resultados

Os resultados obtidos pelos pesquisadores indicam que as auditorias públicas e a divulgação de informações sobre atos de corrupção política antes das eleições diminuem a probabilidade de reeleição de prefeitos identificados como corruptos. Em municípios com duas violações identificadas pelas auditorias, a probabilidade de reeleição dos prefeitos foi 17% menor quando as auditorias ocorreram antes das eleições, em comparação com os municípios auditados depois das eleições. Mesmo nos casos em que os prefeitos identificados como corruptos conseguiram se reeleger, a margem de votos observada foi menor.

Outro resultado encontrado pelos pesquisadores aponta para o fato de que eleitores bem informados penalizam políticos com maiores níveis de corrupção. Nos municípios auditados antes das eleições, a probabilidade de reeleição do prefeito foi reduzida em 7 pontos percentuais para cada ato de corrupção identificado. Já no grupo de controle, quando as auditorias ocorreram depois das eleições, não houve mudanças observáveis nas probabilidades de reeleição de prefeitos corruptos. Obviamente, essa informação colabora com o argumento de que os eleitores gostariam de penalizar atos de corrupção, mas não possuem as informações necessárias para implementar tais atitudes.

Com a realização do estudo, também é possível afirmar que a presença de mídias locais favorece a disseminação de informações úteis à sociedade. Foi identificado pelos pesquisadores que em municípios nos quais os prefeitos tiveram três atos corruptos identificados pelas auditorias antes das eleições, a cobertura de rádio AM reduziu em 16 pontos percentuais a probabilidade de reeleição. Em locais sem a presença de rádios regionais, a redução observada foi de apenas 3,7 pontos percentuais.

Além de penalizar políticos corruptos, a presença de mídias locais também favorece a reeleição de políticos corretos. Sob a cobertura das rádios regionais, políticos que não tiveram atos corruptos identificados aumentaram suas chances de reeleição em 17 pontos percentuais. Isso ocorre porque informações críveis moldam as decisões dos eleitores, fazendo com que políticos corruptos sejam penalizados e políticos idôneos sejam beneficiados, o que pode também ter impacto na atuação da classe política como um todo.

Lições de Política Pública

A pesquisa demonstra que a disseminação de informações críveis é fundamental para o pleno exercício da democracia. Auditorias públicas possuem a capacidade de informar a população de modo a incentivar boas práticas no combate à corrupção, desde que esses dados sejam repassados de modo inteligível e acessível. Uma vez que informações relevantes são absorvidas pelos eleitores, políticos corruptos tendem a ser penalizados e adversários honestos tendem a ser beneficiados.

Para tanto, a presença de mídias locais é relevante, assim como a transparência e a produção de informações úteis. A presença de rádios locais demonstra que canais de comunicação com o público são importantes pelo fato de que disseminam informações necessárias e adaptam as expectativas dos eleitores, influenciando os resultados de eleições e implementando a responsabilização de atos de corrupção política. Não basta produzir a informação, ela tem que ser devidamente absorvida pela sociedade.

Referência

FERRAZ, Claudio; FINAN, Frederico. Exposing corrupt politicians: the effects of Brazil's publicly released audits on electoral outcomes. The Quarterly journal of economics, v. 123, n. 2, p. 703-745, 2008.

 

 

 

 

 

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