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Privatizar o saneamento em Minas Gerais foi uma boa decisão?

05 nov 2021

Pesquisador responsável: Angelo Cruz do Nascimento Varella

Título do artigo: PRIVATIZAÇÃO DAS COMPANHIAS ESTADUAIS DE SANEAMENTO: UMA ANÁLISE A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DE MINAS GERAIS

Autores do artigo: Thiago Guedes de Oliveira e Sonaly Cristina Rezende Borges de Lima

Localização da intervenção: Minas Gerais, Brasil

Tamanho da amostra: Dadossobre a operação da companhia entre os anos de 2003 e 2012, além de outras informações socioeconômicas do mesmo período.

Setor: Outros

Tipo de Intervenção: Efeitos da privatização do saneamento

Variável de Interesse principal: Oferta de serviços de água e de saneamento básico

Método de avaliação: Outros

Problema de Política

O debate sobre a privatização de empresas públicas é intenso no Brasil. Aqueles que são favoráveis argumentam sobre os ganhos de eficiência que o setor privado oferece, teoricamente melhorando a oferta de bens públicos, além de diminuir a necessidade de investimentos públicos. Entretanto, os críticos às privatizações ressaltam que empresas privadas, ao priorizar lucros individuais, não atendem às demandas da população e acabam depreciando a oferta de bens e serviços públicos.

Em relação ao saneamento básico, este tema é ainda mais sensível, pois impacta diretamente na saúde e na qualidade de vida da população, sendo direito garantido pela constituição brasileira. Dessa forma, pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) avaliam se o processo de privatização da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA) gerou consequências e desdobramentos positivos para o estado mineiro.

Contexto de Implementação e de Avaliação

As companhias estaduais de saneamento básico foram criadas no Brasil ao longo da década de 1960 e suas competências envolvem a prestação de serviços de água potável e esgoto sanitário. A forte onda de investimentos públicos que possibilitou essa criação, encerrou-se durante a década de 1980, de modo que o sistema público entrou em considerável crise econômica.

Como consequência, governadores de estados como Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo iniciaram movimentações para a abertura do capital de suas empresas estaduais de saneamento nos mercados financeiros, que é uma forma de privatização. Dentre os principais argumentos, destacam-se a facilidade no acesso a investimentos e os ganhos de eficiência que podem gerar melhorias na prestação dos serviços e no aumento da rede de cobertura da companhia.

É importante destacar, entretanto, que não havia consenso científico. Vários estudiosos apresentaram argumentos e exemplos contrários, demonstrando que a privatização recorrentemente não é o melhor caminho, especialmente em função da natureza primordial do saneamento básico, que é incompatível com sistemas baseados em premissas lucrativas. Em outras palavras, mesmo que os ganhos de eficiência e de investimentos realmente ocorressem, os benefícios não superariam os prejuízos públicos causados pela privatização.

Detalhes da Política

A abertura de capital da COPASA ocorreu em fevereiro de 2006, captando 806 milhões de reais a partir da negociação de ações na Bolsa de Valores de São Paulo (BOVESPA). O montante equivale a 40% do patrimônio líquido observado pela companhia no ano de 2005, cujo valor foi de 2,06 bilhões de reais.

A privatização por meio de abertura de capital, que ocorre quando ações da empresa pública são colocadas à venda no mercado financeiro, permite à empresa receber capital privado e investir na melhoria e expansão de seus serviços. Entretanto, ao efetivar a venda, a companhia estadual também recebe a necessidade de operar com lucratividade. No mercado de fornecimento de água e esgoto, esse fenômeno torna a decisão de investir em locais menos desenvolvidos ainda mais difícil.

Este fenômeno ocorre porque a prestação de serviços de abastecimento e de saneamento possuem receitas, custos e investimentos distintos. Dessa forma, operações em regiões de difícil acesso, com baixa densidade urbana ou com menores perspectivas de retorno são menos lucrativas e nem sempre atendem às demandas de mercado. Desse modo, os pesquisadores realizam uma análise geral das informações relacionadas à atuação da companhia antes e depois do processo de privatização.

Detalhes da Metodologia

A base de dados que compõe a pesquisa foi coletada a partir de diversas outras bases e atividades de pesquisa. Informações sobre a atuação e resultados financeiros da companhia foram fornecidas pela própria COPASA, para os anos de 2003 a 2012. Dados sobre a cobertura dos serviços e outros aspectos socioeconômicos foram coletados a partir da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB), para os anos 2000 e 2008, e dos Censos Demográficos de 2000 e de 2010. Finalmente, para validar os dados obtidos, 15 entrevistas foram conduzidas com profissionais e pesquisadores da área.

Os testes estatísticos realizados comparam as médias das amostras de cada uma das variáveis analisadas e determinam se houve ou não melhorias e avanços na prestação dos serviços ofertados pela COPASA e por outras instituições públicas.  

Resultados

Os principais resultados mostram que a privatização da COPASA não confirmou as expectativas dos governantes e demais agentes envolvidos no processo, de modo similar ao que outros estudos no Brasil e no mundo afirmam.

Apesar de realmente haver avanços e melhorias na oferta dos serviços de água e saneamento nos municípios atendidos pela COPASA, esses resultados não diferem dos demais municípios de Minas Gerais, mesmo levando em consideração aqueles que recebem serviços estritamente públicos. Além disso, os autores afirmam que as práticas adotadas pela companhia depois de 2006, quando a empresa passa a operar no mercado de ações, as premissas de lucro alteram as características públicas da atuação da COPASA, de modo que regiões menos desenvolvidas são claramente afetadas negativamente. Em outras palavras, a COPASA passa a ignorar sua função pública, o que penaliza mais aqueles que mais dependem do serviço vital de água potável e esgoto sanitário.

Lições de Política Pública

É preciso ressaltar que o presente trabalho não conclui definitivamente que privatizações não ruins. Investir em serviços públicos essenciais é tarefa necessária de qualquer governo e a privatização é uma opção viável. No entanto, também é preciso destacar que a privatização pode ser uma opção ruim. Especialmente em casos nos quais os bens e serviços públicos ofertados são essenciais e insubstituíveis, como é o exemplo mineiro de fornecimento de água e saneamento básico.

Ao planejar um processo de privatização é imprescindível contar que a vida de pessoas pode ser afetada pela busca pelo lucro e que é dever do governo impedir que o sistema financeiro prevaleça frente aos direitos fundamentais de seus cidadãos. Afinal, uma sociedade desenvolvida depende da saúde de sua população.

Assim, levar em consideração os custos sociais de um sistema de privatização é obrigatório e deve pautar quaisquer sistemas de planejamento e de monitoramento que visem tornar privados os bens públicos nacionais.

Referência

Oliveira, Thiago Guedes de; Lima, Sonaly Cristina Rezende Borges de. Privatização das Companhias Estaduais de Saneamento: Uma análise a partir da experiência de Minas Gerais. Ambiente & Sociedade, V. 18, P. 253-272, 2015.