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Sistema eleitoral brasileiro: quais os incentivos para a corrupção?

27 jul 2021

Pesquisador responsável: Pedro Jorge Holanda Alves

Título do artigo: ELECTORAL ACCOUNTABILITY AND CORRUPTION: EVIDENCE FROM THE AUDITS OF LOCAL GOVERNMENTS

Autores do artigo: Claudio Ferraz e Frederico Finan

Localização da Intervenção: Brasil

Tamanho da Amostra: 476 observações

Setor: Política Econômica e Governança

Tipo de Intervenção: Efeito da política institucional eleitoral sobre a corrupção

Variável de Interesse principal: Quantidade total de recursos relacionados a atividades corrompidas

Método de avaliação: Avaliação Experimental (RCT)

Problema de Política

Quando vamos estudar sobre economia, começamos compreendendo que os bens são escassos e precisamos tomar as decisões que mais satisfaçam nossos respectivos desejos. Ao introduzirmos o setor público, adicionamos o detalhe de que o Estado deve tomar a decisão que melhor satisfaça a população que irá usufruir dessas políticas. A democracia entra como o fator político que fornece o direito à população definir qual agente representará a sociedade na decisão dessas políticas.

Na realidade sabemos que nem sempre isto acontece. Em diversos casos nos deparamos com situações de abuso do poder político, corrupção e qualquer outro fator que se torne uma ameaça para as democracias modernas. Os países subdesenvolvidos, em particular, servem de exemplo por existir diversos casos em que as elites políticas desviam verbas públicas destinadas à saúde, educação e segurança para obter ganhos privados. Acredita-se que tanto a parcela das práticas de corrupção como também os meios de correção estão associados aos sistemas eleitorais, já que a forma como se determina o sistema eleitoral ou as decisões adotadas pela população podem ser fatores decisórios de um político optar por se corromper ou não.

Por esse motivo, Ferraz e Finan (2011) buscam examinar os efeitos da responsabilidade eleitoral na corrupção dos governos locais no Brasil. Para suas análises, os autores utilizaram relatórios do Programa Anticorrupção que audita de forma aleatória os municípios brasileiros, fazendo análises relacionadas a fraudes dos gestores municipais. O objetivo é verificar os incentivos à reeleição comparando prefeitos que estão no primeiro mandato de governo com aqueles que estão no segundo (e último) mandato e indícios desses prefeitos se corromperem.

Contexto de Avaliação

Desde a Constituição Federal de 1988, o Brasil vem adotando políticas, tanto voltadas à estrutura institucional, como também a políticas de fiscalização fiscal do Estado. Em 1997 se introduziu a possibilidade de reeleição e em 2003, foi criada pela Controladoria Geral da União (CGU) o programa anticorrupção com o objetivo de auditar de forma aleatória os municípios brasileiros. A combinação das duas políticas permite comparar os níveis de corrupção entre 2001-2004 dos prefeitos que estão no seu primeiro mandato com aqueles que estão no segundo mandato.

Mesmo que um prefeito só possa ocupar o cargo apenas por dois mandatos consecutivos, existe a possibilidade de retornar após um hiato de um mandato. Contudo, apenas 12% dos políticos que cumpriram o seu segundo mandato em 2004 decidiram se eleger em 2008 após o hiato, indicando baixa probabilidade de retornarem ao cargo de político no futuro e evidenciando que o prefeito médio trata o segundo mandato como se tivesse cumprindo seu último mandato.

Detalhes da Política

Criado em maio de 2003, o programa anticorrupção, implementado pela CGU, tem o objetivo diminuir o uso indevido de recursos públicos entre os administradores públicos dos municípios e incentivar a sociedade a participar no controle dos gastos públicos. Em seu primeiro ano, o programa auditou 26 municípios aleatórios, cada um em um estado do Brasil.

Por meio de loterias realizadas pela Caixa Econômica Federal em Brasília, o programa expandiu-se e auditou 50 prefeituras no segundo período e depois mais 60 municípios, todos eles com menos de 450.000 habitantes. Para garantir que a auditoria vai funcionar, a imprensa e população local são convidados para testemunhar a loteria e certificar que todos os 10 a 15 auditores da CGU irão examinar e registrar as informações da forma mais fidedigna possível.

Após uma semana de inspeções, um relatório detalhado descrevendo todas as irregularidades é enviado à CGU, que encaminha para o Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério Público e o poder legislativo do município. As principais conclusões da auditoria são publicadas na internet e divulgadas na mídia. São por estes relatórios que Ferraz e Finan (2011) embasaram-se para mensurar a corrupção.

Detalhes da Metodologia

A partir da codificação dos relatórios, Ferraz e Finan (2011) definiram a quantidade total de recursos relacionados a atividades corrompidas como sua principal variável de interesse. Também relatam dois outros indicadores de corrupção: número de irregularidades relacionadas à corrupção e o compartilhamento de itens de serviços relacionados à corrupção. Para medir violações não visíveis, utilizaram um indicador de má administração, que representa o número de violações pelo número de serviços auditados.

O objetivo principal é analisar se os incentivos à reeleição afetam a corrupção política no município. Para a estimação desses resultados, o ideal seria a atribuição aleatória da possibilidade de reeleição dos municípios, para depois medir a diferença entre os dois grupos de municípios (primeiro e segundo mandato). Mesmo que a seleção dos municípios da CGU seja aleatória, o experimento ficaria defasado em função da natureza dos dados. Para resolver este problema, os autores partem para um cálculo de Regressão Descontínua (RDD), que permite uma aproximação de um experimento aleatório, que compara apenas prefeitos que ganharam as reeleições por um percentual muito pequeno com aqueles que perderam por muito pouco.

Este modelo permite comparar dois grupos que por algum motivo exógeno (fora de controle) são muito parecidos, mas tiveram destinos diferentes. Para adaptação da ideia com a Regressão Descontínua, são definidos prefeitos que, na concorrência do seu segundo mandato, perderam ou ganharam nas eleições de 2000 por um percentual muito pequeno. O uso deste achado permite considerar que os dois indivíduos são semelhantes e que a única diferença entre eles ocorre por questões eleitorais pequenas ou irrisórias.

Para os municípios que ganharam por pouco, o tratamento seriam os prefeitos que estão no segundo mandato de governo, enquanto que os que perderam por pouco são substituídos por um novo prefeito, que configuram o grupo de controle, por estarem no primeiro mandato.

Resultados

Os resultados mostram que prefeitos com incentivos a se reeleger são menos corruptos do que aqueles sem incentivos à reeleição. Prefeitos no primeiro mandato tem, em média, uma parcela de recursos desviados 27% menor que prefeitos no segundo mandato. Considerando que os municípios recebem, em média, US$ 2 milhões de transferências federais, os prefeitos que estão no segundo mandato roubam US$ 55 mil a mais e o incentivo à reeleição reduz a corrupção em US$ 150 milhões em todo o Brasil, o equivalente a metade do que o governo federal gastou em 2002 com o programa de transferência de renda do Bolsa Escola.

Também é evidenciado que os incentivos à reeleição variam de acordo com as diferenças nos contextos institucionais locais, por exemplo, público e mídia local. Em geral, municípios sem a presença de mídia local, os incentivos à reeleição reduzem a corrupção política e, por outro lado, prefeitos que ganharam por maiores diferenças podem se dar o luxo de serem mais corruptos.

Lições de Política Pública

Corrupção é um tema recorrente e importante nos estudos empíricos. Recursos que poderiam ter sido destinados a escolas ou hospitais são desviados e utilizados para benefícios próprios. O abuso de poder dos políticos eleitos é uma questão central de um grande número de países, sendo necessário buscar medidas que reduzam a corrupção e gerar melhores investimentos para a população.

A corrupção está ligada a diversos fatores, que englobam desde questões relacionadas às instituições democráticas, até a ausência de fiscalização popular e punição da justiça. Neste trabalho, Ferraz e Finan (2011) destacam como a estrutura e a responsabilidade eleitoral, relacionadas com a possibilidade de reeleição, podem afetar a disciplina dos políticos e controlar seu comportamento de desviar verbas públicas.

Seus achados são importantes uma vez que políticos no primeiro mandato estão associados a menos corrupção, indicando que o segundo mandato, por ser o último, faz com que os prefeitos se tornem mais propensos a cometer irregularidades.

Referência:

FERRAZ, Claudio; FINAN, Frederico. Electoral accountability and corruption: Evidence from the audits of local governments. American Economic Review, v. 101, n. 4, p. 1274-1311, 2011.