Pesquisador responsável: Bruno Benevit
Título original: Do Right-to-Work Laws Work? Evidence on Individuals’ Well-Being and Economic Sentiment
Autores: Christos Andreas Makridis
Localização da Intervenção: Estados Unidos
Tamanho da Amostra: 2,45 milhões de indivíduos-ano
Setor: Economia do Trabalho
Variável de Interesse Principal: Bem-estar dos indivíduos
Tipo de Intervenção: Lei de “direito ao trabalho”
Metodologia: OLS,DID, Pareamento por Entropia
Resumo
No decorrer das últimas décadas, a parcela de estados que adotam leis de “direito ao trabalho” (RTW) tornou-se maioria nos Estados Unidos. Tais leis permitem que trabalhadores em locais de trabalho sindicalizados possam trabalhar sem a necessidade do pagamento de taxas sindicais. Nesse sentido, o senso subjetivo de bem-estar dos trabalhadores que beneficiam-se da representação sindical sem contribuir pode ser afetado. Este estudo avaliou como a adoção de leis RTW impacta a satisfação com a vida e o sentimento com as perspectivas econômicas dos trabalhadores. Os resultados mostraram que a adoção das leis RTW está associada a um aumento na satisfação com a vida e no sentimento econômico. Essas melhorias foram mais evidentes entre trabalhadores sindicalizados. As evidências também sugerem que a maior concorrência entre os sindicatos, decorrente das leis RTW, provocou a oferta de serviços de melhor qualidade valorizados pelos membros.
As leis de “direito ao trabalho” ("right-to-work" – RTW) têm se tornado cada vez mais presentes nos Estados Unidos. Antes uma minoria entre os estados, os estados com leis de RTW passaram a corresponder a pouco mais da metade em 2018. Tais leis impedem que empresas e sindicatos estabeleçam acordos que exijam contribuição compulsória dos trabalhadores sindicalizados para a manutenção da representação sindical. Como consequência, mesmo em firmas sindicalizadas, os funcionários podem optar por não pagar taxas sindicais, embora ainda se beneficiem das negociações coletivas.
A literatura sobre leis de RTW e sindicalização apresenta evidências variadas sobre seus impactos (MAKRIDIS, 2019). Enquanto alguns estudos sugerem que essas leis têm um efeito simbólico, sem reduzir substancialmente a densidade sindical, outros indicam que há uma queda inicial na filiação, seguida por uma estabilização ao longo do tempo. As leis de RTW podem influenciar o mercado de trabalho ao favorecer políticas pró-negócios associadas ao crescimento da manufatura e ao aumento do emprego e dos salários. Além disso, os impactos dos sindicatos podem modificar a estrutura financeira das empresas e, por outro, oferecem aos trabalhadores uma plataforma coletiva de barganha para a negociação de melhores salários e condições de trabalho.
Nesse contexto, a adoção dessas leis gera um intenso debate, especialmente entre sindicatos e defensores da representação trabalhista, devido às possíveis implicações para a adesão sindical e para as condições de trabalho.
As relações de trabalho nos Estados Unidos passaram por transformações ao longo do século XX, impulsionadas por mudanças legislativas que moldaram a atuação dos sindicatos. A promulgação do National Labor Relations Act (NLRA) em 1935 permitiu que trabalhadores do setor privado se organizassem em sindicatos e negociassem acordos coletivos, estabelecendo a obrigatoriedade do pagamento de contribuições sindicais para todos os empregados abrangidos pelos contratos. No entanto, a aprovação do Taft-Hartley Act em 1947 modificou essa estrutura ao permitir que os estados adotassem leis de RTW, eliminando a exigência de contribuições compulsórias e alterando a dinâmica do financiamento sindical. Desde então, 27 estados instituíram leis de RTW.
A literatura sobre as leis de RTW tem investigado principalmente seus efeitos sobre a filiação sindical, o emprego e os salários. De maneira geral, há indícios de que essas leis reduzem a densidade sindical (EREN; OZBEKLIK, 2016), embora esse efeito possa diminuir ao longo do tempo. Já os impactos sobre emprego e remuneração são menos conclusivos. Enquanto algumas evidências sugerem que estados com leis de RTW apresentam maior crescimento da atividade manufatureira (KALENKOSKI; LACOMBE, 2006), outros estudos indicam efeitos nulos nessas variáveis (EREN; OZBEKLIK, 2016). Além disso, essas leis podem gerar incentivos para que os sindicatos ofereçam melhores serviços para atrair e reter membros. Contudo, a capacidade de negociação coletiva pode ser comprometida diante de uma restrição de arrecadação.
A fonte de dados principal do estudo foi proveniente das pesquisas diárias conduzidas pela Gallup Inc., que entrevistaram cerca de 1.000 adultos nos Estados Unidos por meio de chamadas telefônicas assistidas por computador. Essa amostra incluiu indivíduos com 18 anos ou mais, selecionados aleatoriamente em todos os 50 estados e no Distrito de Columbia, com informações detalhadas sobre localização, como código postal e região metropolitana. As perguntas do levantamento foram divididas em dois blocos principais: um focado em bem-estar e outro em política e economia, ambos coletando as mesmas informações demográficas. O índice de bem-estar utilizado no estudo baseou-se em escalas de satisfação com a vida no presente e na expectativa futura, enquanto o sentimento econômico é medido por indicadores sobre a percepção do estado atual e futuro da economia. As entrevistas também observaram variáveis de contexto socioeconômico, como nível educacional e distribuição racial.
Adicionalmente, o estudo também considerou dados complementares de fontes governamentais Current Population Survey (CPS), Country Business Patterns (CBP), Time Use Survey (ATUS) e Panel Study of Income Dynamics (PSID), contemplando dados demográficos, comportamentais e de uso do tempo. As amostras principais consideradas no estudo foram segmentadas em períodos distintos, compreendendo períodos entre 2008 e 2017. A análise permitiu a observação de tendências ao longo do tempo e comparações entre estados com e sem leis de RTW, em específico o impacto na adoção de RTW em cinco estados ao longo desse período: Michigan (2012), Indiana (2012), Wisconsin (2015), Virgínia Ocidental (2016) e Kentucky (2017). Os dados foram ponderados para garantir representatividade nacional.
Os dados revelaram que os estados com e sem leis de RTW apresentaram diferenças em diversas características demográficas, econômicas e institucionais. Em termos de composição populacional, os estados (com leis) RTW tendem a ter uma menor proporção de indivíduos brancos em comparação com os sem leis RTW. Além disso, a participação de indivíduos com pós-graduação é ligeiramente menor nos estados RTW. No mercado de trabalho, esses estados registraram maior crescimento populacional e do emprego, além de uma participação relativamente maior do setor manufatureiro. As taxas de sindicalização observadas também foram substancialmente mais baixas nos estados RTW, potencialmente influenciando diferenças nas condições de trabalho e na percepção dos trabalhadores sobre o ambiente profissional. Quanto ao bem-estar subjetivo, indivíduos em estados RTW apresentaram níveis ligeiramente mais altos de satisfação com a vida e maior otimismo em relação à economia.
Para estimar o impacto da adoção de leis estaduais de RTW sobre o bem-estar e o sentimento sobre a economia dos trabalhadores, o autor adotou duas estratégias de identificação principais. Primeiramente, foi empregado um modelo de Mínimos Quadrados Ordinários (OLS) para o período de 2008 a 2017. Como covariáveis, foram considerados o grau de instrução, gênero, idade e raça dos indivíduos, além dos efeitos fixos de estado e tempo.
Posteriormente, adotou-se o método de diferença em diferenças (DID) para identificar o efeito da interação entre a presença de lei de RTW no estado e a sindicalização dos trabalhadores. Esse modelo possui a premissa de que trabalhadores sindicalizados manteriam tendências similares, “paralelas”, aos não sindicalizados em seus respectivos estados caso a lei de RTW não tivesse sido adotada. A análise com esse modelo contemplou o período de 2009 a 2016 e considerou as mesmas covariáveis do modelo de OLS. Adicionalmente, também foi implementado o método de pareamento por entropia para controlar possíveis efeitos não observáveis variantes no tempo.
Por fim, o estudo apresentou uma série de análises para verificar a robustez e os possíveis mecanismos por trás dos resultados identificados nas análises principais. Assim, verificou-se a existência de quatro mecanismos. Primeiro, estimou-se possíveis impactos de renda do “problema do caroneiro” (free riding) decorrente do aumento de consumo impulsionado pela ausência da necessidade de contribuição aos sindicatos. Segundo, analisou-se a possibilidade de impactos ligados à mudança de composição dos trabalhadores que permaneceram sindicalizados após a adoção da lei de RTW. Terceiro, o autor observou se a lei de RTW induziu os sindicatos a serem mais competitivos diante da não obrigatoriedade de contribuição. Quarto, procurou-se identificar a existência de possíveis choques induzidos por políticas favoráveis aos negócios concomitantemente com a adoção das leis de RTW.
Os resultados da estimação por OLS indicou que a adoção de leis de RTW está associada a um aumento na satisfação atual com a vida, na expectativa de satisfação futura e no sentimento econômico dos trabalhadores. Sem a inclusão de efeitos fixos, os trabalhadores em estados de RTW apresentaram uma satisfação com a vida entre 2,7 e 3,1 ponto percentual (p.p.) maior, além de um sentimento econômico 3,2 p.p. superior. Com a inclusão de efeitos fixos de estado e tempo, os impactos se mantêm positivos, mas ligeiramente menores, com elevações de 2,9 p.p. na satisfação atual com a vida, 1,2 p.p. na expectativa de satisfação futura e 4,1% no sentimento econômico, sendo que esse último efeito não é estatisticamente significativo.
Os resultados da estimação por DID reforçaram os resultados positivos anteriores das leis de RTW sobre o bem-estar dos trabalhadores, especialmente entre os sindicalizados. A implementação dessas leis está associada a um aumento de 2,1 p.p. na satisfação atual com a vida e de 7,6 p.p. no sentimento econômico dos trabalhadores sindicalizados. Esses efeitos são estatisticamente significativos, com o impacto no sentimento econômico sendo mais robusto. A comparação entre as especificações dos modelos sugere que os estados que adotaram leis de RTW não estavam, previamente, em uma trajetória de crescimento diferenciado que pudesse explicar esses resultados.
Com relação aos mecanismos, os resultados indicaram que os efeitos de renda e de composição não explicam o impacto das leis de RTW sobre o bem-estar dos trabalhadores. Os resultados da análise demonstraram que o aumento necessário na renda para justificar o efeito observado seria significativamente maior do que a economia gerada pela isenção das contribuições, indicando que este mecanismo não é determinante. Já o efeito de composição sugere que a saída de trabalhadores menos satisfeitos dos sindicatos poderia aumentar a média de satisfação dos que permanecem. Contudo, as estimativas demonstraram que a produtividade não observada dos trabalhadores sindicalizados não varia significativamente após a adoção das leis de RTW, de forma que esse mecanismo explicaria, no máximo, metade do efeito identificado.
Por outro lado, há evidências de que a competição entre sindicatos e políticas pró-negócios poderia contribuir para os resultados observados, induzindo melhorias na gestão do ambiente de trabalho. Os resultados revelaram que a probabilidade de os trabalhadores perceberem seus supervisores como parceiros aumenta em 1 p.p., enquanto a percepção de um ambiente de trabalho aberto e confiável cresce 0,7 p.p., sugerindo mudanças nas práticas sindicais. Além disso, a análise acerca de impactos de políticas simultâneas descartou a hipótese de que os efeitos sejam impulsionados por políticas pró-negócios associadas à aprovação das leis de RTW.
Neste artigo, os autores avaliaram os efeitos da adoção de leis de RTW sobre o bem-estar dos trabalhadores e seu sentimento em relação à economia. Os resultados indicam que a implementação dessas leis esteve associada a um aumento na satisfação com a vida entre os trabalhadores sindicalizados, sem efeitos adversos significativos para os não sindicalizados. Além disso, a adoção das leis de RTW foi acompanhada por uma melhora na percepção dos trabalhadores sobre o ambiente de trabalho, incluindo maior confiança nos gestores e maior sensação de parceria no ambiente profissional. Esses efeitos foram mais evidentes no setor privado, onde a concorrência entre sindicatos parece ter incentivado melhores práticas de gestão.
As evidências apresentadas contribuem para a compreensão dos impactos das leis de RTW no mercado de trabalho e no bem-estar dos trabalhadores, fornecendo subsídios para o debate sobre a formulação de políticas trabalhistas alinhadas às demandas dos trabalhadores. Dado que a adoção dessas leis está associada a mudanças na estrutura sindical e na percepção dos trabalhadores sobre o ambiente de trabalho, políticas que busquem equilibrar a liberdade de escolha dos trabalhadores com incentivos para boas práticas sindicais e empresariais podem ser importantes para aprimorar o seu bem-estar.
Referências
EREN, O.; OZBEKLIK, S. What Do Right‐to‐Work Laws Do? Evidence from a Synthetic Control Method Analysis. Journal of Policy Analysis and Management, v. 35, n. 1, p. 173–194, jan. 2016.
KALENKOSKI, C. M.; LACOMBE, D. J. Right-to-Work Laws and Manufacturing Employment: The Importance of Spatial Dependence. Southern Economic Journal, v. 73, n. 2, p. 402, 1 out. 2006.
MAKRIDIS, C. A. Do Right-to-Work Laws Work? Evidence on Individuals’ Well-Being and Economic Sentiment. The Journal of Law and Economics, v. 62, n. 4, p. 713–745, nov. 2019.