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Existe Rent-Seeking nos Municípios Brasileiros?

13 nov 2020

Pesquisador responsável: Adriano Valladão Pires Ribeiro

Título do artigo:  TESTANDO RENT-SEEKING NO BRASIL: DESIGUALDADE E ARRECADAÇÃO DE IPTU NOS MUNICÍPIOS BRASILEIROS

Autores do artigo: Rodrigo Mahlmeister, Bruno Kawaoka Komatsu e Naercio Menezes Filho

Localização da intervenção: Brasil

Tamanho da amostra: 9.456 observações

Grande tema:  Política Econômica e Governança

Tipo de Intervenção: Relação entre desigualdade e arrecadação

Variável de interesse principal: Arrecadação do IPTU (representando o rent-seeking)

Método de avaliação:  Método de Primeiras diferenças

Problema de Política

O rent-seeking, ou captura pela elite, acontece quando alguma instituição tenta auferir ganhos adicionais sem nenhuma contrapartida em termos de aumento de produtividade. No contexto das cidades brasileiras, pode ser entendido como a parcela da sociedade com maior poder aquisitivo tentando influenciar o setor público a direcionar recursos públicos a gastos e arrecadações de seus interesses. Isto é, amenizando a arrecadação de impostos diretos e regressivos, como o IPTU, e/ou direcionando gastos sociais para outras áreas, como infraestrutura. Portanto, nessas situações, políticas redistributivas seriam barradas ou minimizadas, o que manteria ou ampliaria a desigualdade econômica.

Contexto da Avaliação

O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), devido suas características, pode ser usado para investigar a existência de captura pela elite nos municípios brasileiros. O imposto, por um lado, não tem uma importância muito grande para as receitas do município, por outro, ele é decidido totalmente no nível municipal, estando, assim, mais suscetível às elites. O IPTU também pode ser visto como instrumento para reduzir desigualdades sociais, visto que é incidido diretamente sobre o patrimônio. Além disso, gastos sociais com saúde, saneamento, educação e cultura podem igualmente serem usados na investigação por apresentarem substitutos privados, ou seja, caso haja captura pela elite, esses dispêndios teriam uma prioridade menor.

Detalhes da Intervenção

Pela discussão acima, existiria uma relação positiva entre desigualdade e captura pela elite. Em termos práticos, busca-se a relação entre a desigualdade de renda, medido pelo coeficiente de Gini, e a arrecadação do IPTU. Os dados são compostos por informações dos municípios brasileiros em 2000 e em 2010 e algumas observações fazem-se pertinentes para o período.

Primeiro, nota-se que, para 2000 e 2010, o IPTU é, de fato, relativamente pequeno frente ao PIB per capita, além disso, a média dos gastos em educação, cultura, saúde e saneamento cresceram, ainda que o ritmo dos dois últimos tenha sido mais intenso. Observou-se também uma redução da desigualdade, dada uma leve queda no índice de Gini (de 0,62 para 0,60). Por outro lado, tanto a correlação entre a arrecadação do IPTU per capita e o índice de Gini  quanto a correlação entre as variações na arrecadação do IPTU e do índice de Gini são negativas, indicando que maior desigualdade está associado a menor arrecadação de IPTU.

O mesmo exercício pode ser feito quanto a relação entre desigualdade e gastos sociais em educação, cultura, saúde e saneamento. A correlação era negativa entre a desigualdade e os gastos em educação e cultura em 2000, porém ela passa a inexistir em 2010. Em outras palavras, em 2000, maior desigualdade estava associada a menores dispêndios em educação e cultura, já em 2010 os gastos nessas áreas seriam semelhantes independentemente da desigualdade. O índice de Gini se correlaciona negativamente com os gastos em saúde e saneamento tanto em 2000 quanto em 2010. Além disso, as correlações entre variação no índice de Gini e variação nos gastos sociais apontam tanto para uma associação positiva entre o aumento na desigualdade e aumento nos gastos em educação e cultura quanto para nenhuma associação entre variação da desigualdade e gastos em saúde e saneamento.

Por fim, vale analisar a situação do índice de Gini entre esses dois anos. Os municípios mais desiguais em 2000 foram os que mais reduziram a desigualdade até 2010, porém grande parte dos municípios menos desiguais em 2000 aumentou a desigualdade até 2010. Os gastos em educação e cultura tiveram o mesmo padrão, em que os gastos dos municípios que menos desembolsavam em 2000 nessas áreas foram os que mais cresceram. O mesmo vale dizer para os gastos em saúde e saneamento.

Metodologia

O objetivo principal é mensurar se um aumento da desigualdade nos municípios entre 2000 e 2010 está associado a uma queda na arrecadação do IPTU. Para tanto, utiliza-se da abordagem em primeiras diferenças, que consiste em tomar a diferença entre os valores das observações de 2010 e 2000 tendo em vista a eliminação dos efeitos específicos de cada cidade. Isto é, algumas características específicas de cada cidade que influenciam a relação entre desigualdade e IPTU seriam as mesmas nos dois anos, portanto a diferença dos valores anularia os efeitos relacionados a essas características. Além disso, usando a mesma abordagem, considera-se também a relação entre a variação do índice de Gini e os gastos sociais em educação, cultura, saúde e saneamento, uma vez que a captura pela elite também poderia influenciar esses gastos.

Resultados

O resultado da investigação principal indica que a arrecadação per capita do IPTU e a desigualdade possuem uma relação negativa, ou seja, quanto maior a desigualdade, menor seria a arrecadação. Em números, o aumento de 1% da desigualdade implicaria em queda de 0,5% na arrecadação do IPTU por pessoa. Para os gastos em educação e cultura, o resultado aponta para uma relação positiva entre desigualdade e o dispêndio nessas áreas, municípios mais desiguais gastariam mais em educação e cultura. Por último, a relação entre o índice de Gini e os gastos com saúde e saneamento seria nula, a desigualdade poderia ser maior ou menor para qualquer nível de gastos em saúde e saneamento.

Pelos resultados, a relação entre desigualdade e arrecadação do IPTU insinua a presença de captura pela elite, porém a relação entre o índice de Gini e os gastos sociais sugerem o oposto. Uma exploração mais profunda desses resultados aponta que a relação negativa entre arrecadação do IPTU e desigualdade se dá pelos municípios com as menores médias de renda em 2000, isto é, os municípios inicialmente mais pobres. Já a associação positiva entre desigualdade e gastos em educação e cultura ocorre nos municípios inicialmente mais ricos e onde a desigualdade mais se reduziu entre 2000 e 2010. Para a relação entre índice de Gini e gastos e saúde e saneamento, o resultado é indiferente quanto ao nível médio de renda do município.

Lições de Política Pública

Como aprendizado, os resultados sugerem que a captura pela elite possivelmente ocorre nos municípios mais pobres e desiguais, exatamente aqueles que necessitam de melhores mecanismos de distribuição de renda e provisão de serviços públicos. Nesses municípios, o rent-seeking reduziria a arrecadação de impostos diretos sobre o patrimônio, o IPTU, se apropriando de uma das maneiras de se redistribuir a renda localmente.

Referência

Mahlmeister, Rodrigo; Komatsu, B. K.; Menezes Filho, N. “Testando Rent-Seeking no Brasil: Desigualdade e Arrecadação de IPTU nos Municípios Brasileiros.” Policy Pap, v. 32, 2018.