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Qual é o efeito da Bolsa Família sobre a saúde infantil?

07 set 2020

Pesquisador responsável: Viviane Pires Ribeiro

Título do artigo:  EFFECT OF A CONDITIONAL CASH TRANSFER PROGRAM ON LENGTH-FOR-AGE AND WEIGHT-FOR-AGE IN BRAZILIAN INFANTS AT 24 MONTHS USING DOUBLY-ROBUST, TARGETED ESTIMATION

Autores do artigo: Jeremy A. Labrecque, Jay S. Kaufman, Laura B. Balzer, Richard F. Maclehose, Erin C. Strumpf, Alicia Matijasevich, Iná S. Santos, Kelen H Schmidt e Aluísio J.D. Barros

Localização da intervenção: Brasil

Tamanho da amostra:  1703 crianças

Grande tema:  Saúde

Variável de interesse principal: Saúde infantil

Método de avaliação: Estimativa de máxima probabilidade

Contexto da Avaliação

As Transferências bancária condicionais são programas governamentais que dão auxílio em dinheiro às famílias pobres, desde que elas satisfaçam os requisitos específicos. A maioria dos requisitos se relacionam com a melhoria da saúde infantil e da educação, como a exigência de exames de saúde, vacinas, cuidados pré-natal para a mãe, matrícula escolar ou um nível específico de atendimento escolar. A Bolsa Família (BF) é um programa brasileiro de transferências mensais que teve início em 2004 e as famílias beneficiadas que cumpriam os requisitos (exames de saúde dos filhos, vacinas em dia e frequência escolar maior ou igual a 85%) recebiam entre R$15-95 mensais, dependendo da renda familiar per capita e do número de crianças. Em 2015, a Bolsa Família abrangeu mais de 27 milhões de lares de baixa renda, pagando um total de R$ 28,5 bilhões em 2016, segundo dados da Controladoria-Geral da União Brasileira.

Lebrecque et al. (2018) argumenta que apesar de ser utilizada uma variedade de medidas antropométricas para avaliar o status nutricional infantil, a altura-por-idade ou comprimento-por-idade é de particular interesse por duas razões: elas são boas proxys  do status nutricional acumulado, que permite estudar as consequências nutricionais da BF ao longo prazo; e o baixo crescimento infantil, particularmente nos primeiros 24 meses, é um preditor importante da saúde futura. O peso-por-idade também é usado para avaliar o status nutricional e pode indicar mudanças no status nutricional no curto prazo. Nesse contexto, Lebrecque et al. (2018) estimam o efeito do programa de transferência condicional brasileira, Bolsa Família, sobre o status nutricional infantil, medida pelo comprimento-por-idade e peso-por-idade, desde o nascimento até os 24 meses.

Detalhes da Intervenção

Os dados utilizados pelos autores foram obtidos de Pelotas Birth Cohort, que recrutou 99% dos nascimentos hospitalares em todos os cinco hospitais dentro dos limites da cidade brasileira de Pelotas em 2004. O comprimento-por-idade e peso-por-idade foram calculados usando os padrões de crescimento da Organização Mundial de Saúde de 2006. Os pesquisadores de campo conduziram visitas nas casas para medir as crianças e administrar questionários aos pais. Assim, foram obtidas informações sobre variáveis de pré-natal, parentais e socioeconômicas. Lebrecque et al. (2018) utilizaram dados do nascimento, de 12 e 24 meses, gêmeos e bebês que morreram antes de 24 meses foram excluídos da análise. Os autores também limitaram o estudo às famílias que relataram uma renda per capita de R$100 ou inferior, pois as famílias com renda per capita superior não eram aptas a receber o BF.

Os dados sobre o montante de dinheiro recebido pelos beneficiários da BF foram obtidos pelo site do Portal de Transparência (http://www.portaltransparencia.gov.br). A relação entre o dinheiro recebido da BF e comprimento-por-idade e peso-por-idade foi feita de forma probabilística, usando o nome da criança, data de nascimento, nome dos pais e idade. Totalizando 1703 crianças aptas a receber o benefício.

Detalhes da Metodologia

Lebrecque et al. (2018) dividiram as crianças em três grupos de quantidade total de BF recebidos nos primeiros 24 meses: não BF (recebeu R$ 0), baixa BF (recebeu R$ 1000 ou menos) e alta BF (recebeu mais de R$ 1000). Os autores usaram um método de estimativa de máxima probabilidade, um estimador duplamente robusto, semiparamétrico, substituição eficiente dos parâmetros estatísticos, para estimar o efeito de receber baixos e altos níveis de BF sobre o status nutricional infantil, medida pelo comprimento-por-idade e peso-por-idade, desde o nascimento até os 24 meses.

Resultados

Das 1703 famílias estudadas, 110 pertenciam ao grupo de baixo BF e 319 estavam no grupo de alta BF, nos primeiros 12 meses. Em 24 meses, 291 famílias estavam no grupo de baixa BF e 355 no grupo de alta BF. Em média, as famílias participantes receberam a BF para os 16 dos 24 meses após o nascimento da criança (com desvio-padrão igual a 8). Das famílias que iniciaram a BF, 96% ainda estavam recebendo após 24 meses do nascimento do filho.

O padrão das mães que receberam BF e que participaram da análise é: mais velhas, altura menor, baixo nível de escolaridade, tiveram poucas consultas de pré-natal, ganharam menos peso durante a gravidez, mais prováveis de fumar e menos prováveis de trabalhar durante a gravidez quando comparado às mães que não receberam BF. O comprimento de nascimento, peso de nascimento, idade gestacional e problemas de saúde relatados no nascimento eram todos similares pelo nível de BF. Todas as variáveis socioeconômicas indicaram que as famílias expostas eram notavelmente mais pobres e tinham famílias maiores.

Os autores encontraram uma associação negativa entre BF e altura-por-idade e peso-por-idade em quase todos os níveis de BF. A associação foi maior para alta BF em altura-por-idade e peso-por-idade em 24 meses, com uma redução em torno de 0,19 z-scores em ambos os casos. As comparações entre baixa BF e alta BF foram todas negativas, mas teve intervalos de confiança também consistente com valores positivos. As estimativas foram menores em 12 meses do que em 24 meses.

Lições de Política Pública

Qual é o efeito da Bolsa Família sobre a saúde infantil? Os resultados obtidos por Lebrecque et al. (2018) indicam que nos primeiros dois anos do nascimento da criança, as famílias que receberam Bolsa Família foram negativamente associadas ao status nutricional infantil. Em 24 meses, esta associação negativa é equivalente a aproximadamente três semanas de crescimento atrasado em altura-por-idade e cinco semanas de crescimento atrasado em peso-por-idade.

Os autores ressaltam que, apesar dos seus esforços, não se pode eliminar a possibilidade de confusão residual. Mas se os resultados não são devido à confusão residual das estimativas, há possíveis mecanismos causais que permitem explicar que a Bolsa família tenha um efeito negativo sobre a altura-por-idade e peso-por-idade da criança. Alguns estudos sugerem que o recebimento de BF pode estar associada à compra de alimentos menos nutritivos. Outro estudo no nordeste do Brasil descobriu que as famílias que receberam BF tinham três vezes mais chances de consumir alimentos pobres em nutrientes do que as famílias que não receberam BF. Uma dieta mais pobre pode levar a um aumento de infecções ou deficiências de micronutrientes que podem, por sua vez, reduzir a altura-por-idade. Existem também, contudo, algumas pesquisas demonstrando uma relação positiva entre a BF e a dieta e a nutrição. Portanto, Lebrecque et al. (2018) argumentam que são necessários estudos adicionais com dados mais recentes para determinar se esta relação negativa entre Bolsa Família e saúde infantil se mantém no presente, dado que os autores utilizaram dados dos primeiros anos de pagamento de BF.

Referências

LABRECQUE, Jeremy A. et al. Effect of a conditional cash transfer program on length-for-age and weight-for-age in Brazilian infants at 24 months using doubly-robust, targeted estimation. Social Science & Medicine, v. 211, p. 9-15, 2018.